Breve Histórico.
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) foi criado pela Lei nº 5.107/1966, revogada pela Lei 7.839/1989 que estabeleceu a Caixa Econômica Federal (CEF) como único operador do Fundo. Atualmente, a Lei que dispõe sobre o FGT é a Lei nº 8.026/1990.
Antes de a CEF se tornar o único agente operador do FGTS, diversos bancos poderiam gerir o fundo do FGTS de seus clientes. Após esta alteração pela norma, os bancos passaram a ter 2 (dois) anos para, em conjunto com a Caixa Econômica Federal (CEF), operacionalizarem a transferências dos recursos.
O Problema!
Foi justamente nesta migração dos fundos para a Caixa Econômica Federal que começou a surgir o problema.
É que durante a transferência dos recursos dos outros bancos para a CEF muitas informações se perderam e o valor transferido pode estar muito abaixo do devido.
Em torno de 76 bancos na época poderiam gerir os recursos do FGTS, contudo muitas destas instituições financeiras passavam por dificuldades de ordem financeira e organizacional.
A CEF reconhece o problema!
No artigo nominado de Biografia do FGTS, disponível no site da CEF[1], consta a seguinte informação:
Ora, a CAIXA, como banco administrador de contas vinculadas, ainda engatinhava, não possuía ainda o know how necessário e enfrentava enormes dificuldades para estruturação de suas unidades regionais, sem contar que as tecnologias de informática utilizadas pela CAIXA ainda eram aquelas herdadas do BNH, mas, por outro lado, acabara de receber a incumbência de trazer todas as contas que estavam em poder dos bancos, no prazo de um ano.
[…]
Ao lado de tarefa sem precedente e numa época desprovida das facilidades atuais na área da informática e as dificuldades de toda ordem, havia resistência de alguns bancos arrecadadores a entregar os cadastros à CAIXA, na esperança de reverter o processo e manter as coisas exatamente como estavam.
[…]
Muitos bancos acabaram desistindo de abrigar essas contas. Os recursos do Fundo demoravam, em média, 72 dias para ser transferidos dos bancos para o BNH. E os trabalhadores, donos do patrimônio, não vêm tendo acesso adequado a suas contas.
Ainda existe solução?
Diante destes fatos, surgem algumas perguntas: não é tarde demais para buscar estes recursos? Como o banco que geria os recursos do FGTS na época já fechou, ainda tenho chance de conseguir meu dinheiro de volta?
De início, adianto: não é tarde demais! Ainda é possível buscar os recursos, mas esta é uma análise mais apurada que depende de uma conversa com seu advogado de confiança.
Mesmo no caso dos bancos que já fecharam as portas, ainda existe a possibilidade de buscar a recomposição do seu saldo do FGTS, pois permanece a responsabilidade da Caixa Econômica Federal.
Esta busca pelos valores não está prescrita?
Entendo que o direito de ajuizar uma Ação na busca dos valores não foi alcançado pela prescrição. A prescrição de 30 anos para o FGTS (Súmula 210 do STJ) diz respeito a busca de contribuições não realizadas ao Fundo.
Quando se trata de má prestação dos serviços pelos bancos na época, têm-se entendido se tratar de hipótese de “fato do serviço”, matéria atinente ao direito do consumidor. Neste caso, a prescrição começa a correr de quando o consumidor toma ciência do problema.
Outrossim, o art. 25 do Decreto 99.684/90, que regulamentou a Lei nº 8.036/90 (FGTS) resguardou “o direito do beneficiário de reclamar, a qualquer tempo, a reposição do valor transferido” decorrente da centralização ocorrida em ABR/1992.
Portanto, entendo que ainda dá tempo de buscar os recursos perdidos do Fundo.
E quanto aos valores?
O valor devido, em alguns casos, pode até ser pequeno, mas em outros pode ter um montante considerável e a busca valer a pena.
Em alguns casos, foi apurada uma diferença significativa, entre R$ 12 mil e R$ 30 mil. Porém, cada situação deve ser vista com parcimônia. Um advogado e um perito especialista podem elaborar os cálculos e apurar possíveis diferenças de valores perdidos no FGTS.
Como os Tribunais estão decidindo sobre o assunto?
Atualmente existem poucas ações tramitando na justiça sobre o tema. Os Tribunais Regionais Federais da 1ª e 3ª Região têm entendido a favor dos fundistas pelo direito de reaver seus valores perdidos pelos bancos quando da época da Centralização dos Fundos.
Veja alguns exemplos:
APLICAÇÃO DE JUROS PROGRESSIVOS. ATENDIMENTO AOS REQUISITOS (CPC, ART. 333). MIGRAÇÃO DE DEPÓSITOS DO FGTS. RESPONSABILIDADE DA CEF PELO FORNECIMENTO DE EXTRATOS E FISCALIZAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA (DECRETO 99.684/90). PRERROGATIVA DE EXIGIR DOS BANCOS A PRESTAÇÃO DE CONTAS DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA ANTERIOR. CABIMENTO DE AÇÃO PRÓPRIA NO CASO DE DESCUMPRIMENTO.
[…]
4. Quando da migração dos depósitos de FGTS então existentes nos bancos depositários, coube à CEF a fiscalização da transferência do numerário. Assim, como gestora do Fundo, a Caixa tem responsabilidade pela aplicação dos juros progressivos mesmo em relação ao período anterior à centralização das contas vinculadas, cabendo a ela a efetivação do “registro dos valores transferidos e a discriminação dos depósitos efetuados na vigência do último contrato de trabalho”, por força do art. 24 do Decreto n. 99.684/90.
5. Por isso, não se pode afastar a responsabilidade da ré pelo fornecimento dos extratos, na medida em que se não usou da prerrogativa legal de exigir a prestação de contas da movimentação anterior à centralização dos depósitos do FGTS, em poder dos bancos, ou se tal diligência foi frustrada, deveria intentar ação própria nesse sentido.
(TRF-1 AC: 0012649-35.2006.4.01.3811, Relator: Juíza Federal Maria Cecília de Marco Rocha, Relatora Convocada, Data de Julgamento: 07/10/2015, Quinta Turma, Data de Publicação: 03/11/2015 e-DJF1 P. 261)
FGTS. CONTA VINCULADA DO AUTOR NÃO LOCALIZADA PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. DEPÓSITOS EFETUADOS ANTES DA CENTRALIZAÇÃO DAS CONTAS FUNDIÁRIAS JUNTO À CEF. EXISTÊNCIA DA CONTA VINCULADA COMPROVADA NOS AUTOS. RESPONSABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PELA RECOMPOSIÇÃO DO SALDO.
1. A Lei n. 8.036, de 11/05/1990 determina à CEF o papel de agente operador (art. 4.º) do FGTS e estabelece como uma de suas atribuições a manutenção e controle das contas vinculadas.
2. O Decreto n. 99.684, de 08/11/1990, que regulamenta a Lei n. 8.036/1990, fixa, como prazo para a assunção do controle das contas vinculadas, 14/05/1991.
3. No período anterior à migração, a responsabilidade pela manutenção e controle das contas vinculadas era do banco depositário, sendo que, a partir da Lei n. 8.036/1990, a Caixa Econômica Federal passou a centralizar os recursos do FGTS e a controlar as contas vinculadas e, em contrapartida, foi determinada a obrigação de emitir regularmente os extratos das contas individuais vinculadas.
4. O próprio Decreto n. 99.684/1990 estabelece que, no momento da centralização, os bancos depositários emitirão os extratos das contas vinculadas, que deverão conter o registro dos valores transferidos.
5. Ainda que a CEF não tenha localizado a conta do autor, e ainda que se trate de período anterior a centralização das contas, o certo é que ela detém a responsabilidade pelo controle e manutenção das contas vinculadas ao FGTS, podendo requisitar, dos antigos bancos depositários, tanto os extratos quanto os numerários ainda não transferidos.
6. Ainda que a existência da conta vinculada, com os respectivos depósitos, compreenda o período que antecede à migração, não há de se afastar o dever de indenização por parte do banco depositário e da CEF.
7. A questão sob enfoque se refere ao fato de que a conta fundiária não foi localizada, embora os documentos carreados aos autos não deixem dúvidas da existência dessa conta.
8. Sendo assim, a responsabilidade é da CEF e também do Banco Santander.
9. Apelações da CEF e do Banco Santander Brasil S/A não providas.
(TRF3, 1ª T., 0001416-17.2014.4.03.6103, Ap 2122744, Rel. Hélio Nogueira, DJe 22/10/2018 – negrito nosso) “
E se os recursos eram do pai/mãe já falecidos. Os herdeiros têm direito?
Sim. Na qualidade de herdeiro, persiste o direito aos recursos perdidos da época.
Se o trabalhador sacou os recursos antes da centralização de ABR/1992? Ainda assim tem direito?
Neste caso, não. Só tem direito a buscar a indenização pelos fundos que foram perdidos a centralização ocorrida em ABR/1992. Só vale para a pessoa que tinha recursos foram migrados na Centralização e atualmente os bancos (CEF e o banco depositário da época) não estão sendo transparentes, antes negam-se a fornecerem os extratos.
Se os recursos não foram migrados, não há o que pedir de recursos da época anterior à migração de ABR/1992.
E agora? O que fazer?
Para saber se os recursos do seu FGTS em período anterior a 1992 foram perdidos é necessário comparecer a uma agência da Caixa Econômica Federal e pedir o extrato do FGTS. Leve consigo os seguintes documentos:
- Documento de RG e CPF com foto;
- Número de inscrição no NIS ou PIS ou PASEP;
- Extrato da antiga conta do FGTS, se houver;
- Se possível, comprovante (ao menos alguns) de que o seu empregador na época efetivamente realizou o pagamento do FGTS.
Lembre-se de pedir à CEF que te entregue o extrato referente ao período que antecede ABR/1992, pois de desde então, você consegue através do site ou do aplicativo.
Se não conseguir a restauração dos valores do FGTS após conversar com a CEF, procure um advogado de sua confiança que tenha experiência em ações do gênero para apresentar outro caminho possível.
11 de junho de 2021
Autor:
Lucas Amaral
Advogado Graduado em Direito, Pós-Graduado em Direito Tributário, Assessor Jurídico com experiência e expertise nas áreas do Direito Administrativo, Tributário e do Trabalho.
[1] https://www.caixa.gov.br/Downloads/fgts-informacoes-diversas/Biografia_do_FGTS.pdf